As razões do mundo
não são exactamente as tuas razões.
Viver de mãos acesas não é fácil,
viver é iluminar
de luz rasante a espessura do corpo,
a cegueira do muro.
Esse gosto a sangue
que trazia a primavera, se primavera havia,
não conduz à coroa do lume.
Os negros lençóis da água,
o excremento dos corvos marinhos
fazem parte da tua agonia.
E um sabor a sémen
que sempre a maresia traz consigo.
(As razões do mundo, Eugénio de Andrade, em “Branco no branco”, 1984)